Minha vida em São José dos Campos18 minutos de leitura

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A bomba dos anos oitenta

Podemos encontrar uma vasta gama de informações sobre a década dos anos oitenta. O site infoescola.com é uma dessas fontes, e diz: “Comumente, os anos 80 são chamados de década perdida no que se refere ao desenvolvimento econômico. Vivido pelo Brasil e por outros países da América Latina, esse período de estagnação formou-se com uma retração agressiva da produção industrial. Na maioria destas nações, os anos 80 são o mesmo que crise na economia, inflação, crescimento baixo do Produto Interno Bruto (PIB), volatilidade de mercados e aumento da desigualdade social.”

Nunca o dinheiro mudou tanto.

No dia 16 de novembro de 1983, uma quarta-feira, depois de descansar no feriado da véspera, Mendes, do RH da Kodak, orientava os empregados sobre seus caminhos, dirigindo boa parte deles ao departamento de pessoal. Eu era um dos demitidos.

Nem vale a pena recordar os argumentos. Foi um baque difícil, especialmente por saber que a escolha fora por motivo pessoal do novo chefe.

Com o PDI (Plano de Demissão Involuntária), tivemos alguns benefícios: assistência médica e seguro de vida estendidos por seis meses, salários extras e apoio de uma empresa especializada em recolocação profissional, além dos votos de boa sorte. Precisaríamos disso, principalmente ao levar a notícia para a família.

O mercado estava fechado, o tempo de vacas gordas havia passado, era hora de pensar fora da caixa e procurar um caminho autônomo.

Meu ex-colega – também demitido por birra pessoal – Nelson Monteiro Marcondes e eu decidimos nos unir e partir para um negócio próprio. A primeira ideia foi comprar um posto de gasolina, entretanto, o dinheiro que possuíamos não era suficiente. Uma casa lotérica também estava além de nossas possibilidades. O acaso nos levou a um bar, o Bar do Geraldão, que ficava na esquina da Rua Madre Paula de São José com a Avenida Heitor Villa Lobos, que estava à venda.

Mantivemos o estabelecimento fechado por dois meses, para reforma (que nós mesmos realizamos) e transformação em uma casa de sucos com o nome fantasia Skina. Uma furada. Perdemos todo o estoque de frutas. Decidimos, então, torná-lo uma lanchonete, e sem a menor experiência, abríamos suas portas às quatro da tarde. Enfim, em cinco meses havíamos perdido tudo e tínhamos uma dívida a ser paga. Lá se foram dois carros, aparelho de som, filmadora… Só não entreguei a roupa do corpo para não ser preso por atentado ao pudor.

Conseguimos nos livrar, digo, vender o bar sem receber um centavo sequer e seguimos rumos diferentes.

Tempos depois, graças às gratificações do Banco do Brasil, que pagava aos funcionários quinze salários por ano mais quinquênios, encomendamos os armários para a cozinha de casa. Contratamos um sujeito muito bem recomendado, excelente marceneiro, o Eleison. Eu mesmo havia desenhado o projeto, elogiado por ele.

Quando soube que em sua equipe havia somente dois ajudantes além dele, perguntei se ele toparia uma sociedade. A resposta foi curta e grossa: “Um dividido por dois dá meio para cada um. Não me interessa.”

Só quem carrega o próprio balde sabe o valor de cada gota d’água

A oficina era – digamos – medíocre, para dizer pouco. Num lote pequeno, havia duas coberturas laterais, tipo meia-água, que despejavam a chuva no corredor central, sem calçamento, espalhando respingos para a área coberta e formando lama. Ao fundo, um depósito frágil e um banheiro. As máquinas eram pequenas e antigas. A madeira maciça era armazenada na pequena área dos fundos, a céu aberto. Mas o aluguel era de apenas trezentos cruzeiros.

Ali comecei a entender a preocupação de dividir um por dois. O “um” já era meio. E conhecendo o potencial daquele marceneiro, eu imaginava uma produção significativa que exigiria um investimento de respeito.

Sem chance de me tornar sócio, propus que ele me contratasse como vendedor, uma atividade que eu abominava… A decisão foi rápida e favorável. Bastou que ele acrescentasse minha comissão aos preços que praticava e tudo estava resolvido.

Havia um grande crescimento imobiliário na cidade, era fácil encontrar imóveis em fase de construção. Criamos o nome Madecor, o logotipo, mandamos confeccionar cartões de visita de madeira e eu saí em busca de novos clientes. O resultado foi surpreendente, e logo preencheria a capacidade de produção da equipe. Para encurtar a história, seis meses depois estávamos num galpão de 200 metros quadrados dez vezes mais caro (eu era o fiador), com vários marceneiros e ajudantes, telefone e máquinas maiores. Isso me custou o conforto, pois o dinheiro da venda da minha Belina foi todo colocado ali e minha locomoção era feita de bicicleta.

Quando, finalmente, noticiei meu desligamento, pedindo todas as comissões devidas (ainda não pagas), o dinheiro investido e o telefone cedido por minha esposa, consegui a sociedade. Durou quase três anos e nos trouxe ótimas recompensas, até que meu sócio se envolvesse emocionalmente com uma nova mulher.

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